Amputação – tabagismo: orientações médicas corretas, desobediência do paciente 15.11.2019 • por Diego Mariante Cardoso
Paciente com queixa de dor lombar e dormência nos membros inferiores procurou atendimento. Possuía quarenta e seis anos, era tabagista (mais de duas carteiras por dia), há muito tempo, e apresentava os sintomas progressivos nos últimos anos; já havia consultado outros profissionais e tinha o diagnóstico de ser portador de problemas circulatórios. Informou que todos os médicos que consultara anteriormente sempre o orientaram a não fumar, porém não conseguia abandonar o tabagismo. O diagnóstico realizado foi o de Tromboangeite Obliterante (TAO), doença inflamatória que atinge preferencialmente as artérias dos membros inferiores, e que determinava de há muito os sintomas referidos. Foram orientadas diversas condutas, entre elas, a mais importante: não fumar, e evitar também a convivência com fumantes, pois desta maneira a doença estaria mantida no estágio em que se encontrava e poderia, de acordo com estatísticas, ter uma melhora de até 30%. Foi alertado o mesmo, ainda, de que se não obedecesse às recomendações o curso natural da doença levaria fatalmente a complicações isquêmicas graves determinando uma amputação ao nível da perna ou coxa. Aproximadamente sete meses depois, dito paciente submeteu-se a cirurgia de revascularização no membro inferior direito, sendo que tal procedimento foi realizado por outros profissionais. Entretanto, passados quatro meses de tal intervenção cirúrgica, houve nova internação, quando constatou-se que a referida revascularização estava obstruída, pelo que procedeu-se à amputação ao nível da coxa da perna direita.
O paciente ajuizou ação indenizatória – postulando danos materiais e morais em decorrência da amputação ocorrida –, contra o Hospital e o médico que realizou o primeiro atendimento, alegando que este teria sido imprudente, negligente e imperito, pois não teria investigado a patologia. O médico apresentou defesa no processo, relatando como ocorreu seu atendimento – o qual acontecera conforme a descrição supra – e asseverando que o mesmo foi adequado, conforme a literatura médica, e não causou dano algum.
No processo, foi realizada prova pericial, a qual confirmou a defesa do médico, destacando o tabagismo do paciente como a principal causa da doença. Eis um trecho do laudo pericial - excerto que, inclusive, foi reproduzido pela própria sentença: “Paciente portador de doença arterosclerótica desencadeada pelo fumo, evoluindo como esperado para paciente com diagnóstico de arterite (doença esta inflamatória desencadeada pelo fumo). Não vejo nenhuma imperícia ou negligência neste caso, somente conduta normal conforme a literatura.” Ainda a perícia: “Paciente com doença crônica dentro da evolução esperada, raramente escapa desta evolução.”
Na mesma senda da perícia, o magistrado que julgou o processo entendeu a matéria conforme apresentada pela defesa. E a não obediência, pelo paciente, da orientação de não fumar foi assim avaliada pela sentença (julgamento do processo em primeira instância): “O que se evidencia, em verdade, é que o autor pouco fez da principal orientação: parar de fumar, prática suspensa somente após a realização da cirurgia de revascularização da perna em (...), oportunidade, inclusive, omitida nos argumentos da inicial, a fim de evidenciar o caráter negligente tanto do hospital quanto do médico réu”.
Eis aí outro ponto interessante da sentença: “Concretamente – não obstante o laudo pericial ter concluído pela inexistência de nexo causal entre a conduta do médico réu e a amputação da perna do autor – o demandante teve um agravamento de sua doença, que levou os médicos, também vinculados ao primeiro demandado, a optar pela cirurgia de revascularização, em flagrante tentativa de minimizar a moléstia do autor e quiçá, evitar a amputação da perna. Tal procedimento, repito, foi omitido pelo autor, no afã de responsabilizar os réus pela perda do membro inferior direito”. A sentença, portanto, considerou que os atos médicos foram corretos, e não há nexo causal entre os mesmos e a amputação ocorrida; assim, julgou-se a ação favoravelmente ao médico e ao hospital, negando os pedidos do paciente autor.