Histerectomia e lesão femural: uma análise de defesa médica 29.06.2022 • por Diego Mariante Cardoso
Categorias no site: direito médico, artigos
Histerectomia e lesão femural: uma análise de defesa médica
por Diego Mariante Cardoso
O Direito Médico envolve diversos serviços como a defesa médica em caso de conflitos judiciais ou a assessoria jurídica para auxílio técnico de consultórios, clínicas, hospitais e outros. Para facilitar a sua compreensão, faremos a análise de jurisprudência sobre um conflito judicial envolvendo uma lesão femural pós-histerectomia.
Ao longo da história você poderá acompanhar diversas etapas fundamentais para a defesa médica. Vamos lá?
A internação
A paciente foi internada devido ao diagnóstico de metrorragia por miomatose uterina. Devido persistência dos sintomas e risco para a saúde foi indicada a realização de uma histerectomia. Ela recebeu um termo de consentimento informado, explicando os prós e contras do procedimento. Todas as informações do documento foram explicadas antes da sua assinatura.
A cirurgia realizou-se de acordo com a técnica clássica empregada no hospital, que contava com uma Programa de Residência Médica. Por isso, a histerectomia foi realizada por um grupo de residentes sob a supervisão do preceptor, o qual não necessitou participar do ato, pois não houve intercorrências. A anestesia também transcorreu sem incidentes.
O pós-operatório ocorreu normalmente, com exceção do fato de que a paciente caminhava com dificuldade, apresentando paresia do membro inferior esquerdo. Três dias depois foi constatada a melhora do quadro, assim como uma boa recuperação da intervenção cirúrgica. Com isso, a paciente obteve alta hospitalar e recebeu orientações para dar a continuidade de seu tratamento em regime ambulatorial.
O retorno hospitalar
Tempos depois, a paciente retornou ao atendimento, para tratar problemas na parte motora do membro inferior esquerdo. Foram realizados alguns exames que um importante comprometimento dos nervos femoral e obturador.
Contudo, ambos os nervos se localizam distantes da área operada na paciente, isto é, útero e ovários. Dessa forma, ela recebeu encaminhamento para o Serviço de Neurologia e para a realização de fisioterapia.
O Conflito Judicial e a Defesa Médica
A paciente, inconformada, ingressou em juízo contra o preceptor e o hospital, alegando ocorrência de erro médico no procedimento, o que lhe teria causado os danos já referidos.
O médico defendeu-se, relatando o atendimento prestado, afirmando sua adequação aos preceitos científicos aplicáveis. Foi destacado inclusive, a diferença entre a localização da cirurgia e a do suposto dano. A defesa médica no processo seguiu com uma ampla e complexa produção de provas nos autos.
Provas periciais
A perícia levantou a hipótese de que o uso do afastador cirúrgico pudesse causar a lesão:
“Existem relatos de lesão traumática do nervo femoral em caso de histerectomia total abdominal por miomatose uterina, devido ao uso de afastador cirúrgico.”
Entretanto, o perito também destacou que tal ocorrência não significa que tenha havido qualquer falha por parte do cirurgião, segundo outro trecho do laudo pericial:
“...este tipo de lesão ocorrida devido ao procedimento cirúrgico, está provavelmente associada ao uso de afastadores cirúrgicos. A lesão apresentada pela autora é uma complicação cirúrgica que pode ocorrer, inerente ao tipo de cirurgia, e não necessariamente, decorrente de um mau atendimento ou uma imperícia técnica (...)”.
Depoimentos testemunhais
Os depoimentos colhidos ao longo do processo trouxeram importantes informações, elencando possíveis causas além do uso do afastador:
“(...) ela pode ter tido um edema muscular, ela pode ter tido uma isquemia, ela pode ter tido uma alteração anatômica do nervo. Depende do tipo de bacia, este nervo pode ter passado mais embaixo, mais em cima. Tracionou, puxou, deu hematoma e nem foi do afastador.”
Outra testemunha também discorreu a respeito das etiologias em questão:
“(...) pode ser por um hematoma da musculatura, pode ser por compressão do nervo, pode ser por um problema isquêmico. Existem várias etiologias (...)”.
A Sentença
Conforme foi demonstrado, nenhuma das explicações citadas pressupõe falha médica. Dessa forma, o magistrado de primeira instância julgou o processo favorável ao médico e ao hospital, negando os pedidos da autora:
“De acordo com a prova coligida nos autos, os réus procederam à cirurgia, e ao tratamento pós-operatório em conformidade com a técnica específica para a cirurgia de histerectomia abdominal total, não restando comprovado que agiram culposamente.”
Ou seja, a defesa médica conseguiu demonstrar plenamente que o atendimento foi realizado de forma correta.